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Fonte: Tribuna do Ceará |
A Câmara dos Vereadores de
Fortaleza aprovou ontem (15/05) a lei que regulamento a utilização de
aplicativos de transporte como, por exemplo, o Uber e nas postagens dos
principais jornais da cidade o que mais eu lia eram pessoas revoltadas com a aprovação,
no meio de tudo isso percebi o “mar” de desinformação e conhecimento sobre o
assunto, por isso resolvi escrever.
Talvez parte da revolta das
pessoas seja porque o Uber, em nota, disse que 10 mil motoristas não
conseguiriam atender as regras, que o valor do serviço poderia subir até 80% e
por aí vai. Para começar, bora baixar essa bola, Uber, pode guardar o
sensacionalismo no bolso e lembrar que quando esse tipo de regulamentação foi
incluída na Política Nacional de Mobilidade Urbana, em 1 de março de 2018, a
empresa comemorou a aprovação e lá estava incluído que os municípios iriam
definir as taxas que seriam cobradas, agora sim podemos falar de verdade do
assunto.
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Fonte: O Povo |
E já que estamos falando de
transporte, então estamos falando de Mobilidade Urbana e não é tão difícil
notar que um dos maiores problemas do assunto é a utilização de carros. Só para
termos uma noção, em 2014 atingimos a marca de 1 automóvel para cada 4,4
habitantes no Brasil e a média de ocupantes de um carro em São Paulo no ano de 2011
era de 1,4 pessoas. Se você da sua janela de ônibus, em pé apertado ou passando
de bicicleta olhar para dentro dos carros notará que a quantidade de ocupantes
dificilmente chega em 3 pessoas. Facilmente você nota uma ou duas pessoas,
chega até a ser um pouco injusto para você que está apertado dentro do busão.
Percebem que nesses dados ainda
não existem informações isoladas de transportes por meio de aplicativos? Porque
é algo novo e após ler o livro “Mobilidade Urbana e cidadania” de Eduardo
Alcântara de Vasconcellos fiquei me perguntando quais seriam os impactos no
trânsito com esses aplicativos. Enviei um email para o autor e ele me chamou
atenção para dois fatos interessantes: esses aplicativos são carros, com eles
estão associados todos os impactos de um carro, e a tarifa desses serviços são
“mais acessíveis”. Nosso principal problema são os carros, estamos incentivando
mais carros, estamos pensando em políticas públicas para carros e estamos
deixando de lado quem realmente pode resolver o problema da mobilidade,
transporte público.
Com relação a tarifa destes
aplicativos, elas são realmente menores em relação ao sistema de taxi e mais
pessoas possuem acesso. Aí que mora o perigo, é realmente interessante que as
pessoas tenham acesso a utilizar todo tipo de transporte, porém quando
incentivamos esse tipo de sistema e permitimos que ele funcione de forma mais
solta, haverá um grupo de pessoas que trocará seus deslocamentos de transporte
coletivo pelo carro que te deixa na porta de casa, dessa forma o transporte
coletivo perde na competição com esses aplicativos. O coletivo perde para o
individual e a estrutura da cidade não aguenta tanto veículo individual
circulando.
Não estou desconsiderando que em
algumas cidades esses aplicativos já existem em modalidade compartilhada, que é
uma alternativa interessante visando preencher ao máximo o veículo. Contudo o
nosso principal foco deveria ser em avançar nossas políticas públicas pensando
no coletivo, desde transporte coletivo e a bicicleta, integração entre
sistemas. Falar de tudo isso é importante antes de focar na regulamentação.
Como estamos falando de uma
cidade, por isso a noção de coletivo, precisamos lembrar que as vias são de uso
comum e esses aplicativos utilizam as vias para lucrar e causam impactos nessas
vias. Sei que já existem impostos com relação ao uso particular de um veículo
pensando nos impactos das vias, contudo, só para terem uma ideia, o motorista
do Uber que mais fez viagens em Fortaleza tem uma média de 20 viagens diárias,
seria o equivalente a duas voltas e meia na Terra... não estou brincando, esses
são dados disponibilizados pela empresa em comemoração de dois anos aqui em
Fortaleza. A pessoa que mais utilizou o aplicativo já percorreu 9121km....
esses são só os maiores números, tem muita coisa ainda aí. Pense um pouco nos
impactos disso tudo. A regulamentação só está cobrando 2% por viagem.
Válido lembrar que em março foi
aprovado uma lei que inclui o transporte por aplicativo na Política Nacional de
Mobilidade Urbana (PNMU) e que lá diz que os municípios vão fazer cobranças. A
lei 204/2018 de Fortaleza coloca os pontos que já estão na PNMU e tem como taxa
por viagem esses 2%, mas coloca que pode ser reduzido caso a empresa do
aplicativo realize algumas ações que compensem os impactos dos seus serviços,
ações em Mobilidade Urbana (isso os jornais não te mostraram, né? Isso algumas
pessoas não te falaram, né?).
Outra exigência interessante é
que a empresa compartilhe algumas informações com os órgãos públicos. Essas
informações são sobre origens e destinos, tempo, distâncias, horários entre
outras. São informações essenciais para planejarmos políticas públicas, porque
além de ônibus, topic, metrô, taxi,
teremos esses aplicativos com um impacto considerável nas vias da cidade. Então
precisamos compreender esses dados para melhorar a cidade. Entretanto, tem um
dos pontos da lei que não concordo, que diz que os veículos precisarão ter no
máximo cinco anos. Aí sim vou concordar com a nota emitida pelo Uber quando diz
que isso elitiza o sistema. Por outro lado, os carros terão identificação por
adesiva e acredito que não preciso falar a importância disso depois das mortes
de motoristas de aplicativos que tivemos esse ano.
A regulamentação desse tipo de
transporte não é algo nova, seis países regulamentaram em 2016; em 2017 a União
Europeia começou a discussão sobre a regulamentação. Por isso queria dizer que
a lei não é de toda ruim e não vai impactar tanto negativamente quanto estão
dizendo, válido lembrar que esses sistemas já estão impactando nossa cidade.
Não podemos deixar de lado o olhar mais técnico, porque são argumentos
construídos com ciência, seriedade. De leis na base do achismo e do que
político A ou B acredita nós já estamos cheios e não estão funcionando, por
mais que eu acredite que vereadores, de um modo geral, não tiveram esse olhar
técnico.
Lucas Gonçalves Monte
FONTES:
Lei de regulamentação em Fortaleza: http://216.59.16.201:8080/sapl/sapl_documentos/materia/38815_texto_integral
“Câmara de Fortaleza aprova projeto de lei que cria regras
para aplicativos de transporte” – Tribuna do Ceará:
"Uber estima que preço das viagens deve subir 80% em
Fortaleza se Projeto de Lei for aprovado" - Tribuna do Ceará:
"Uber, 99 e Cabify comemoram regulamentação do
transporte por aplicativo aprovada pela Câmara" - G1:
Alteração da Política Nacional de Mobilidade Urbana:
Regulamentação dos aplicativos pelo mundo:
Dois anos de Uber em Fortaleza: