quinta-feira, 31 de julho de 2014

A Doença da Nossa Geração - Nathan Carneiro Parente

                 Toda geração parece ter uma doença social que lhe é comum e eu diria que a da nossa é uma das piores que já houveram. A patologia que nos é comum é fundamentada na velocidade. De tudo reclamamos quando não é veloz: “E essa aula que não acaba!?”, “Esse trabalho que não finda!?”, “Que internet lenta! Por acaso é discada?” e “Que droga de atendimento! Agiliza aí!”. Apesar de algumas dessas frases justificarem a ineficiência de certos serviços, elas, se refletidas, podem mostrar a nós um pouco mais do que isso.
                Você não vai escutar nada mais comum entre as pessoas da nossa época que o velho “Estou sem tempo!” e é isso que usam para justificar a tal velocidade das nossas ações. Dificilmente as pessoas param para refletir acerca disso, pois quando clamam pelo tempo esquecem de se perguntar para quê precisam de tempo e tudo fica compulsório. Trabalho, estudo, compras, mercado, almoço, jantar, aula outra vez e parece que esse ciclo estabelecido tem tolhido de nós a capacidade de olhar com um pouco mais de seriedade para isso e entender que uma hora esse ciclo para, ou pelo menos reduz seu ritmo, mas ainda continuamos com as mesmas justificativas. Talvez se as pessoas soubessem que não é falta de tempo, mas sim falta de prioridade, que causam suas maiores confusões organizacionais, elas entenderiam mais facilmente o que se passam e poderiam tomar alguma atitude a respeito. Eu sei, é duro mesmo ter que dizer para alguém que “não priorizou isso” ao invés de dizer que “não teve tempo”, mas é no mínimo algo honesto.

                O problema do tempo é, na verdade, o problema da prioridade e o problema da prioridade é que, quando priorizamos, já pensamos em estar livres daquela situação para entrar em outra prioridade e, de prioridade em prioridade, vamos perdendo a capacidade de vivenciar aquilo, de aprender com aquilo e, consequentemente, de nos ver naquilo que fazemos. Temos cada vez mais prioridades onde nada é exclusivo, tudo parece excretável e ainda reclamamos da falta de tempo. Se não percebeu, aí vai uma observação potente: o problema disso é que perdemos a capacidade de parar, observar e perceber a importância das coisas, perdemos a capacidade de enxergar os detalhes. No fim, perdemos a capacidade de nos admirar. Embrutecidos por essa “tacocracia” (vem do grego tákhos, que significa rapidez, e kratos, que significa poder), como nos diria o grande professor Mário Sérgio Cortella, fomos levados ao máximo da insensibilidade e perdemos essa capacidade de nos espantar, de ficarmos surpresos.
                Não há, portanto, nada mais brutal para o homem que isso: perder a capacidade de se maravilhar, pois essa foi, sem dúvidas, a raiz de todo pensar, de todo inovar. O que seria, por exemplo, dos cientistas ao longo da história se não tivessem se espantado, ou se admirado, por determinado fenômeno e, logo após, ter refletido sobre aquela observação de forma detalhada? Acredite ou não, o espanto, a admiração, a surpresa – no sentido que vos falo – são as reações mais importantes para o crescimento e a evolução da Filosofia e das Ciências, e não só delas, mas para a evolução do próprio homem, pois causam no ser referido o efeito da curiosidade e a vontade de entender os eventos que o cercam.
                Outra coisa engraçada é que, fundamentado nessa mania de sempre dizer que está sem tempo, o homem tende sempre a culpar alguém, alguma coisa, algum momento ou alguma situação. Por ser mais fácil dizer que esta sem tempo do que que aquilo não era prioridade, o homem não assume a responsabilidade daquilo que escolheu e, não assumindo, é incapaz de desfrutar o momento. Sempre irá ansiar pelo próximo momento, do qual também não assumirá responsabilidade alguma.
                É claro que isso não é um discurso de um moralista, todos nós sofremos com isso alguma hora, mas poucos param para observar e tentar mudar esse loop de reclamações. Poucos param para se espantar com isso e buscar novas formas de aproveitar o tempo, ou melhor, de escolher suas prioridades.
                Um belo dia, saindo do treino, comentei com um amigo (quase um padrinho), sobre a dificuldade que tinha de sair da universidade e pegar um ônibus para chegar a tempo no treino. Além disso, chegava estressado pela quantidade de pessoas que entupiam o coletivo, não deixando espaço para mover quase nada do meu corpo, e ele me disse algo interessante que era mais ou menos assim: “As pessoas enfrentam esse problema porque tem muita pressa para não fazer nada e isso lhes custa caro. Minutos antes de acabar o trabalho o sujeito nem trabalhando mais está. Está contando os minutos e os segundos para sair. Quando da o horário dispara para bater o ponto. Para quê? Advinha? Tomar sua cerveja gelada? Matar a larica? Não! Para ficar preso num engarrafamento de no mínimo uma hora”. A saída apressada então é a ilusão de que vai se chegar a tempo para não fazer absolutamente nada e com isso se perde a oportunidade de concluir seu serviço com excelência, de aprender um pouco mais com aquilo que deveria ser a atividade onde você deve se ver, com aquilo que você supostamente deveria gostar de fazer, já que escolheu esse caminho.

                Pensamos muito nas coisas que temos que fazer, sobre como fazemos, sobre como poderiam ser, mas não refletimos sobre o caminho até lá, que se traduz em observar bem o cotidiano. Refletir sobre isso nem sempre é fácil, porque é como pensar no pensamento, pensar em que rumo seus pensamentos estão tomando, mas certamente isso deveria ser prioridade em nossa vida. Diria o imortal Sócrates: “Uma vida irrefletida não vale a pena ser vivida”.

Nathan Carneiro Parente




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