quinta-feira, 5 de março de 2015

Encontrando com o vento - Alex Viana


                Ganhei minha primeira bicicleta na infância, por volta dos 8 anos. Na verdade, devo dizer ganhamos. Devido a nossa condição financeira à época era uma bicicleta para dividir entre os três irmãos. Nem por isso a satisfação de ter aquele objeto foi diminuída: nós, os irmãos, revezávamos o uso e, cada vez em que eu tive que esperar a minha vez de poder usá-la, aquele momento de ansiedade tornava o prazer de pedalar mais intenso. Demorei um pouco para ganhar o equilíbrio necessário para me manter de pé em cima da magrela, mas logo que aprendi passei a andar pelas ruas próximas de onde morava. Aquilo me dava prazer e eu me sentia livre. Tão livre que um dia me perdi e, sem saber como voltar para casa, pedalei seguindo o vento. Ia por onde o vento soprasse mais forte. E o vento me guiou de volta. Quando dei por mim estava na rua em que morava novamente.
                Fui crescendo e a bicicleta foi sendo deixada de lado, também por causa das condições físicas dela: já era muita velha quando a ganhei.

                Os anos passaram e sempre me voltava a vontade de pedalar novamente livre pela cidade. A falta de recursos e o medo do trânsito me diziam: hoje não, um dia. Quem sabe? Mas foi em um fim de tarde, quando eu saia de uma aula pela 13 de maio, na companhia de uma grande amiga à época, que eu vislumbrei a feição da felicidade. Em meio ao vai e vem dos carros (no começo dos anos 2000 o trânsito não era esse caos que é hoje), vimos, minha amiga e eu, uma moça, bela e sorridente, a pedalar pela avenida. Ela usava um longo vestido e o vento o fazia esvoaçar. Ela impulsionava os pedais da bicicleta e seguia, feliz, como se nada mais no mundo importasse. Seu sorriso estampado no rosto transmitia uma sensação de tamanha leveza que para mim foi como ver a felicidade plena. Naquele momento, talvez por incompreensão daquela felicidade, minha amiga se perguntou em voz alta: como alguém pode ser tão feliz apenas pedalando? Claro que devia existir toda uma conjuntura por trás da cena. Talvez ela apenas parecesse feliz. Mas a imagem que me ficou foi aquela. Foi assim que aquela moça, bela, desconhecida e feliz ficou registrada em minha memória.

                Ainda passou-se um tempo até que eu tivesse minha própria bicicleta novamente. Quando finalmente a vontade encontrou a coragem, aconteceu de um amigo estar se desfazendo da sua magrela e eu fui o escolhido a ganhá-la. Enfrentei algumas críticas e pedidos de precaução ao decidir pelar pela minha cidade novamente. Ouvi coisas do tipo: "você está no Brasil querendo usar um meio de transporte de primeiro mundo" e "vai se arriscar bastante nessas ruas perigosas de Fortaleza". Nada disso me impediu. Tudo que queria era a liberdade de pedalar como quando era criança. Em junho de 2014 me encontrei com o vento.



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