terça-feira, 2 de setembro de 2014

As espumas das ondas da história - Airton de Farias

Fernand Braudel dizia que os acontecimentos são as espumas das ondas da história. As estruturas econômicas e sociais dizem muito mais. Tal premissa ajuda a entender melhor as eleições de 2014. Ao lado das peculiaridades locais, ficou claro nos últimos meses a influência das conjunturas nacionais, igual outros momentos da história cearense. Denotou-se mais uma vez a fragilidade estrutural das lideranças políticas de um estado periférico como o Ceará.

O grupo dos Ferreira Gomes (FG) viu-se em dificuldades. Pelas leis, não poderia escolher ninguém do núcleo familiar como candidato. Os correligionários mais fiéis não tinham capital político suficiente para se aventurarem sós numa eleição difícil. A perturbar ainda, os interesses dos próprios correligionários, ansiosos por quinhões que garantissem seus privilégios no Estado. Os FG comandam, mas têm de fazer concessões, para manter a fidelidade do grupo.

Daí tanta hesitação quanto a candidatura oficial. Como trunfo para o governador, as boas relações com o poder político nacional, aliado importante que é de Dilma e Lula. O problema é que o principal candidato opositor, Eunício Oliveira, igualmente era aliado destes.

Eunício, vendo o arco de alianças costurado pelo governador (fincado em inúmeras prefeituras interioranas e micropartidos), sabendo da influência da máquina pública nas eleições locais, decidiu ousar, aproximando-se do PSDB de Tasso e Aécio. Se vai conseguir fortalecer a candidatura, o tempo responderá, mas essa foi uma ótima brecha para Cid. Talvez não sendo o que de fato desejava, Cid optou pela tática de colar a sobrevivência de seu grupo ao capital político de Lula e Dilma. Matou dois coelhos com uma só cajadada: entregou a cabeça da chapa ao PT, escolhendo, porém, alguém suficientemente dócil a sua liderança, o desconhecido (pela população) Camilo Santana. Jogada de mestre. Não por acaso, a seguir, uma das primeiras declarações de Eunício foi de que “tem gente querendo ser dono de Lula”. Esse parece que será um dos principais motes da campanha.

Ao que consta, a eleição girará em torno de acusações pessoais e promessas gerais de melhorias na educação, segurança, etc., como se isso dependesse apenas da vontade de alguém. Possivelmente não haverá debate sobre as estruturas de nossa sociedade, cujo modelo de desenvolvimento vem ainda do governo do Coronel Virgílio Távora (1963-66), baseado num industrialismo e grandes obras.

Passado meio século, parece claro que apenas isso não mudará a realidade do Ceará, um dos locais socialmente mais injustos e violentos do País. A pobreza, os problemas crônicos de saúde e educação e as grades em nossas janelas são bons argumentos para pedir esse debate.

Possivelmente não haverá debate sobre as estruturas de nossa sociedade cujo modelo de desenvolvimento vem ainda do governo do coronel Virgílio Távora.
Airton de Farias

Fonte: O Povo





Nenhum comentário:

Postar um comentário