sexta-feira, 20 de dezembro de 2013

Quando o medo não nos cala

                Diversas vezes nos deparamos com situações incomodas e às vezes fingimos que não estamos vendo nada ou simplesmente achamos que tentar fazer alguma coisa não vai alterar muito a situação, então por medo ou por alguma outra razão nos omitimos e não comentamos, não opinamos e não causamos nenhum tipo de intervenção. Isso é até algo normal na sociedade atual, talvez o medo constante que circula o nosso entorno causa esse tipo de reação, eu mesmo já passei por isso diversas vezes e na maioria delas me omiti.
                Confesso que na maioria dessas situações eu queria ter feito algo, mas o receio sempre era uma barreira, aparentemente, de proporções imensuráveis e isso me calava. Esse tipo de situação acontece muito quando penso em questionar alguém que na nossa sociedade possa ser considerado, de forma hierárquica, superior.
                Porém chega uma hora que diversos processos construtivos nos tornam pessoas inquietas com esse tipo de situação e tomar uma atitude se faz necessário para que possamos nós mesmos nos aceitar. A omissão passa a ser uma opção frágil diante de tudo que nos construiu. E nessa semana passei por algo que não pude deixar de “intervir”.
                Voltando da Universidade me deparo com três agentes policiais parados no semáforo para pedestres esperando para passar na faixa. O semáforo estava aberto para os motoristas, então os pedestres não poderiam passar, até porque passava constantemente veículos motorizados, afinal é uma avenida de grande movimento, porém os três agentes aproveitaram do bom senso dos motoristas de não parar em cima da faixa de pedestres e do congestionamento em uma faixa e pararam o resto do trânsito para atravessar na faixa de pedestre mesmo com sinal fechado para os pedestres. Logo em seguida outros pedestres acompanharam os três e isso atrapalhou o trânsito, porque tinham outras faixas mais vagas onde os motoristas poderiam adiantar para diminuir o congestionamento ou motos poderiam ter passado por ali, em resumo, não foi respeitado o direito de transitar do motorista e ao mesmo tempo colocou a vida de vários pedestres em risco.
                Mas por que eles fizeram isso? O meu pensamento foi o de que eles estavam em uma ocorrência policial, o que justificaria a pressa, a postura de quem procura alguém e até mesmo “quebrar” uma regra do trânsito. Logo depois que atravesso vou em direção ao Shopping que tem próximo e para a minha surpresa os três também vão. Até me espanto um pouco, porque uma ocorrência policial dentro de um shopping significa que pode ser algo mais sério. Porém, um espanto maior ainda, eles ficam parados em frente ao elevador e a postura mais firme torna-se relaxada.
                Milhões de pensamentos me vêm à cabeça: eles não estão em uma ocorrência policial? Atrapalharam o fluxo por nada? Aquilo foi abusar do exercício de policial militar? Diante de tantas perguntas e de uma inquietação, não consigo me segurar e vou falar com os três.
                Peço para que um deles me tire uma dúvida e a dúvida era: vocês estão em alguma ocorrência policial? A resposta é não. Logo em seguida eu comento a ação deles ao atravessar o semáforo, porém não gostam muito do meu comentário e me tratam com certa hostilidade. Em seguida me perguntam quem sou, me apresento na mesma hora como estudante da UFC.
E eles começam a me “metralhar” com perguntas: você por acaso é guarda de trânsito? Você é jornalista? A onde você está querendo chegar?
                As respostas foram simples. Não sou nem guarda de trânsito e nem jornalista, sou um estudante que observou uma situação que deixou a mim e a outras pessoas incomodadas. E era naquilo que eu queria chegar, no diálogo. Realmente eu queria era conversar com eles sobre o ocorrido, porém eles não aceitavam que eu estivesse puxando aquela conversa. Para eles era inaceitável que um simples estudante estive questionando e ainda me perguntaram se eu achava que eles estavam errados e a resposta é sim!
                Sim, meus caros, vocês erraram, fizeram algo apenas porque estavam fardados e isso pode ser qualificado como abuso de poder e, além disso, causaram certa desordem no trânsito, o que não deixa de ser uma desordem pública, dessa forma desobedecendo ao art. 188 da Constituição Estadual:

Art. 188. Incumbe à Polícia Militar a atividade da preservação da ordem pública em todas as suas modalidades e proteção individual, com desempenhos ostensivos para inibir os atos atentatórios a pessoas e bens.

                Então, não é porque estão com fardamento militar que podem fazer o que quiser e em qualquer local e não é porque sou um estudante que vou deixar de questionar, aí é que questionarei mesmo. Somos indivíduos da sociedade, somos observadores, somos aqueles que constroem esse meio, então temos todo o direito de questionar e tentar estabelecer o dialogo com aqueles que estão exercendo um “poder superior” dentro da sociedade, porque todo os cidadãos unidos formam a maior instância de poder.
                Não devemos permitir que o medo nos cale, devemos é saber ser éticos e prudentes em uma conversa, porque um dos motivos para a nossa sociedade estar do jeito que estar hoje é porque nos calamos diante de tanto abuso de poder. E para aqueles que depois tentaram colocar o medo dentro de mim e que estão com medo de causar intervenções na sociedade, lembre-se

“Do ponto de vista micropolítico, regimes deste tipo correspondem ao triunfo das forças conservadoras do senso-comum sobre as forças da invenção. O pensamento intimida-se e retrai, associado que fica ao perigo de punição que pode incidir sobre a imagem social, estigmatizando-a, como sobre o próprio corpo, com diferentes graus de brutalidade que vão da prisão e da tortura até o assassinato. Humilhada e desautorizada, a dinâmica criadora do desejo paralisa-se sob o domínio do medo, muitas vezes acompanhado de culpa; embora esta parada se dê em nome da preservação da vida, ela pode chegar a uma quase morte. O trauma de experiências deste tipo deixa a marca venenosa de um desgosto de viver e da impossibilidade de pensar; uma ferida no desejo que pode vir a contaminar tudo, brecando grande parte de seus movimentos de conexão e dos gestos de invenção que os mesmos mobilizam”. (Trecho deste link: http://bit.ly/JLcuHK)








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